BRASIL, 01 DE ABRIL, 1964
GOLPE MILITAR
(Golpe de 31 de março de 1964)
Início da década de 1960
No começo da década de 1960, o país atravessava uma profunda agitação política. Depois da renúncia do presidente Jânio Quadros (PTN), em 1961, assumiu seu vice, João Goulart (PTB), conhecido como Jango, Um homem que defendeu medidas consideradas de esquerda para a então política brasileira.
Faziam parte de seus planos as reformas de base, que pretendiam reduzir as desigualdades sociais brasileiras.
Entre estas, estavam as reformas bancária (para ampliar crédito aos produtores), reforma eleitoral (ampliar o voto aos analfabetos e militares de baixas patentes), reforma educacional (valorizar os professores, oferecer ensino para os analfabetos e acabar com as cátedras vitalícias nas universidades) e a reforma agrária (democratizar o uso das terras).
O perfil de Jango logo preocupou as elites, que temiam Uma alteração que ameaçasse seu poder econômico. Entre as medidas sociais adotadas para enfraquecer o então presidente está a adoção do parlamentarismo, que, em 1961 e 1962, atribuiu funções do Executivo ao Congresso, dominado na época por representantes das elites. O regime presidencialista foi restabelecido em 1963 após um plebiscito.
Além da preocupação nas elites escravocratas, extrativistas, patriarcais, oligarcas brasileiras, os EUA também desagradou-se do governo de Jango.
O desagrado norte-americano com Jango aumentou com duas ações de seu governo:
A Lei de Remessas de Lucros de 1962, que impedia multinacionais de enviar mais de 10% dos seus lucros para fora do Brasil.
A política externa independente, praticada pelo Brasil desde o governo de Jânio Quadros.
Por isso o governo norte-americano decidiu interferir nos rumos da política brasileira, financiando grupos conservadores no Brasil. Essa ação dos EUA resultou no surgimento no Instituto Brasileiro de Ação Democrática, o Ibad. Em 1962, descobriu-se que o Ibad recebeu milhões de dólares para financiar candidaturas conservadoras nas eleições disputadas nesse ano.
O objetivo disso era fortalecer ideias de direita e centro-direita, de forma a criar obstáculos para o governo de Jango, barrando as reformas promovidas por ele. O financiamento do Ibad era considerado ilegal aos olhos da legislação da época.
Outros grupos que surgiram durante o governo de João Goulart e trabalharam para tirar sua credibilidade, fomentando discurso antidemocrático e golpista, foram o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (Ipes) e a Rede da Democracia. O primeiro fazia produções audiovisuais e literárias com viés golpista e conservador, e a segunda foi a união de vários veículos de imprensa que consolidaram o discurso da suposta ameaça comunista no governo de Jango.
Na madrugada do dia 31 de março de 1964, um golpe militar foi deflagrado contra o governo legalmente constituído de João Goulart. A falta de reação do governo e dos grupos que lhe davam apoio foi notável. Não se conseguiu articular os militares legalistas. Também fracassou uma greve geral proposta pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) em apoio ao governo. João Goulart, em busca de segurança, viajou no dia 1o de abril do Rio, para Brasília, e em seguida para Porto Alegre, onde Leonel Brizola tentava organizar a resistência com apoio de oficiais legalistas, a exemplo do que ocorrera em 1961. Apesar da insistência de Brizola, Jango desistiu de um confronto militar com os golpistas e seguiu para o exílio no Uruguai, de onde só retornaria ao Brasil para ser sepultado, em 1976.
(cpdoc).
Antes mesmo de Jango deixar o país, o presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, já havia declarado vaga a presidência da República. O presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, assumiu interinamente a presidência, conforme previsto na Constituição de 1946, e como já ocorrera em 1961, após a renúncia de Jânio Quadros. O poder real, no entanto, encontrava-se em mãos militares. No dia 2 de abril, foi organizado o autodenominado "Comando Supremo da Revolução", composto por três membros: o brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo (Aeronáutica), o vice-almirante Augusto Rademaker (Marinha) e o general Artur da Costa e Silva, representante do Exército e homem-forte do triunvirato. Essa junta permaneceria no poder por duas semanas (cpdoc).
Nos primeiros dias após o golpe, uma violenta repressão atingiu os setores politicamente mais mobilizados à esquerda no espectro político, como por exemplo o CGT, a União Nacional dos Estudantes (UNE), as Ligas Camponesas e grupos católicos como a Juventude Universitária Católica (JUC) e a Ação Popular (AP). Milhares de pessoas foram presas de modo irregular, e a ocorrência de casos de tortura foi comum, especialmente no Nordeste. O líder comunista Gregório Bezerra, por exemplo, foi amarrado e arrastado pelas ruas de Recife.
Crise econômica e instabilidade política
Jango propôs, então, reformas constitucionais que aceleraram a reação das elites, criando as condições para o golpe de 1964.
Com as reformas, ele pretendia controlar a remessa de dinheiro para o exterior, dar canais de comunicação aos estudantes e permitir que os analfabetos, maioria da população, votassem.
O estopim para o golpe militar aconteceu em março de 1964, quando Jango, após um discurso inflamado no Rio de Janeiro, determinou a reforma agrária e a nacionalização das refinarias estrangeiras de petróleo.
Imediatamente, a elite reagiu: o clero conservador, a imprensa, o empresariado e a direita em geral organizaram, em São Paulo, a "Marcha da Família Com Deus pela Liberdade", que reuniu cerca de 500 mil pessoas.
O repúdio às tentativas de reforma à Constituição Brasileira e a defesa dos princípios, garantias e prerrogativas democráticas constituíram a tônica de todos os discursos e mensagens.
Em 31 de março daquele ano, os militares iniciam a tomada do poder e a deposição de Jango. No dia 2 de abril, o presidente João Goulart viajou de Brasília para Porto Alegre e Ranieri Mazilli (PSD) assumiu interinamente a presidência do país. Dois dias depois, João Goulart se exilou no Uruguai.
Em 9 de abril, foi editado o AI-1 (Ato Institucional número 1), decreto militar que depôs o presidente e iniciou as cassações dos mandatos políticos. No mesmo mês, o marechal Castello Branco (Arena) foi empossado presidente com um mandato até 24 de janeiro de 1967. Dessa forma os militares ficaram no poder até 1985.
Seu legado foram um grande aumento da pobreza em todo o país, perseguição ao livre pensamento e a livre associação, o pais se aprofundou no mapa da fome além dos gastos astronômicos que levou o pais a um endividamento com o FMI que só foi possivel sanar nos governos progressistas do PT/coalisão.
2022
Neste 31 de Março de 2022, a Diretoria da ABED vem reforçar 0 seu repúdio em relação aos anos de autoritarismo e violência perpetrados pela ditadura militar vivida no Brasil entre 1964 e 1985. Um país desenvolvido e democrático não se constrói sem que haja um verdadeiro reconhecimento dos momentos históricos que o formaram e do rechaço as práticas nefastas, violentas e ilegais que nunca devem ser legitimadas ou repetidas sob nenhum pretexto.
Reafirmamos que democracias como a nossa se sustentam na soberania popular, no sufrágio universal, nas garantias e liberdades individuais e de associação civil, e principalmente, no respeito irrestrito à Constituição, ao equilíbrio de Poderes, ao pluralismo e ao controle civil sobre as Forças Armadas, na construção de pontes da relação civil-militar, práticas essas consolidadas as maiores democracias do mundo. Neste sentido, manifestamos absoluta discordância em relação à Ordem do Dia alusiva ao 31 de março de 1964 assinada pelo ministro da Defesa e os comandantes das forças, a qual expressa uma visão profundamente deturpada dos fatos.
Assim, desejamos que essa data promova na sociedade nacional a reflexão efetiva sobre nosso passado e sobre todas as atitudes violentas e autoritárias perpetradas pelas forças armadas, que detiveram o poder no Estado Brasileiro entre 1964 e 1985, de modo que o futuro possa ser cada vez mais democrático, garantidor de direitos e promotor efetivo do desenvolvimento nacional de forma justa e igualitária.
João Belchior Marques Goulart, conhecido popularmente como Jango (São Borja, 1 de março de 1919 — Mercedes, 6 de dezembro de 1976), foi um advogado e político brasileiro, 24.° presidente do Brasil, de 1961 a 1964. Antes disso, também foi o 14.º vice-presidente do Brasil, de 1956 a 1961, durante os governos dos presidentes Juscelino Kubitschek e Jânio Quadros. Jango foi eleito vice-presidente com mais votos que o próprio presidente JK.
Discurso proferido na sessão de 5 de outubro de 1988, publicado no DANC de 5 de outubro de 1988, p. 14380-14382.
O SR. PRESIDENTE (Ulysses Guimarães) – Exmo. Sr. Presidente da República, José Sarney; Exmo. Sr. Presidente do Senado Federal, Humberto Lucena; Exmo. Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Rafael Mayer; Srs. membros da Mesa da Assembléia Nacional Constituinte; eminente Relator Bernardo Cabral; preclaros Chefes do Poder Legislativo de nações amigas; insignes Embaixadores, saudados no decano D. Carlo Furno; Exmos. Srs. Ministros de Estado; Exmos. Srs. Governadores de Estado; Exmos. Srs. Presidentes de Assembléias Legislativas; dignos Líderes partidários; autoridades civis, militares e religiosas, registrando o comparecimento do Cardeal D. José Freire Falcão, Arcebispo de Brasília, e de D. Luciano Mendes de Almeida, Presidente da CNBB; prestigiosos Srs. Presidentes de confederações, Sras. e Srs. Constituintes; minhas senhoras e meus senhores:
Estatuto do Homem, da Liberdade, da Democracia.
Dois de fevereiro de 1987: “Ecoam nesta sala as reivindicações das ruas. A Nação quer mudar, a Nação deve mudar, a Nação vai mudar.” São palavras constantes do discurso de posse como Presidente da Assembleia Nacional Constituinte.
Hoje, 5 de outubro de 1988, no que tange à Constituição, a Nação mudou.
A Constituição mudou na sua elaboração, mudou na definição dos poderes, mudou restaurando a Federação, mudou quando quer mudar o homem em cidadão, e só é cidadão quem ganha justo e suficiente salário, lê e escreve, mora, tem hospital e remédio, lazer quando descansa.
Num país de 30.401.000 analfabetos, afrontosos 25% da população, cabe advertir: a cidadania começa com o alfabeto.
Chegamos! Esperamos a Constituição como o vigia espera a aurora.
Bem-aventurados os que chegam. Não nos desencaminhamos na longa marcha, não nos desmoralizamos capitulando ante pressões aliciadoras e comprometedoras, não desertamos, não caímos no caminho. Alguns a fatalidade derrubou: Virgílio Távora, Alair Ferreira, Fábio Lucena, Antonio Farias e Norberto Schwantes. Pronunciamos seus nomes queridos com saudade e orgulho: cumpriram com o seu dever.
A Nação nos mandou executar um serviço. Nós o fizemos com amor, aplicação e sem medo.
A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa, ao admitir a reforma.
Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca.
Traidor da Constituição é traidor da Pátria. Conhecemos o caminho maldito: rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério.
A persistência da Constituição é a sobrevivência da democracia.
Quando, após tantos anos de lutas e sacrifícios, promulgamos o estatuto do homem, da liberdade e da democracia, bradamos por imposição de sua honra: temos ódio à ditadura. Ódio e nojo. Amaldiçoamos a tirania onde quer que ela desgrace homens e nações, principalmente na América Latina.
Assinalarei algumas marcas da Constituição que passará a comandar esta grande Nação.
A primeira é a coragem. A coragem é a matéria-prima da civilização. Sem ela, o dever e as instituições perecem. Sem a coragem, as demais virtudes sucumbem na hora do perigo. Sem ela, não haveria a cruz, nem os evangelhos.
A Assembléia Nacional Constituinte rompeu contra o establishment, investiu contra a inércia, desafiou tabus. Não ouviu o refrão saudosista do velho do Restelo, no genial canto de Camões. Suportou a ira e perigosa campanha mercenária dos que se atreveram na tentativa de aviltar legisladores em guardas de suas burras abarrotadas com o ouro de seus privilégios e especulações.
Foi de audácia inovadora a arquitetura da Constituinte, recusando anteprojeto forâneo ou de elaboração interna.
O enorme esforço é dimensionado pelas 61.020 emendas, além de 122 emendas populares, algumas com mais de 1 milhão de assinaturas, que foram apresentadas, publicadas, distribuídas, relatadas e votadas, no longo trajeto das subcomissões à redação final.
A participação foi também pela presença, pois diariamente cerca de 10 mil postulantes franquearam, livremente, as 11 entradas do enorme complexo arquitetônico do Parlamento, na procura dos gabinetes, comissões, galeria e salões.
Há, portanto, representativo e oxigenado sopro de gente, de rua, de praça, de favela, de fábrica, de trabalhadores, de cozinheiros, de menores carentes, de índios, de posseiros, de empresários, de estudantes, de aposentados, de servidores civis e militares, atestando a contemporaneidade e autenticidade social do texto que ora passa a vigorar.
Como o caramujo, guardará para sempre o bramido das ondas de sofrimento, esperança e reivindicações de onde proveio.
A Constituição é caracteristicamente o estatuto do homem. É sua marca de fábrica. O inimigo mortal do homem é a miséria. O estado de direito, consectário da igualdade, não pode conviver com estado de miséria. Mais miserável do que os miseráveis é a sociedade que não acaba com a miséria.
Tipograficamente é hierarquizada a precedência e a preeminência do homem, colocando-o no umbral da Constituição e catalogando-lhe o número não superado, só no art. 5, de 77 incisos e 104 dispositivos.
Não lhe bastou, porém, defendê-lo contra os abusos originários do Estado e de outras procedências. Introduziu o homem no Estado, fazendo-o credor de direitos e serviços, cobráveis inclusive com o mandado de injunção.
Tem substância popular e cristã o título que a consagra: “a Constituição Cidadã”.
Vivenciados e originários dos Estados e Municípios, os Constituintes haveriam de ser fiéis à Federação. Exemplarmente o foram.
No Brasil, desde o Império, o Estado ultraja a geografia. Espantoso despautério: o Estado contra o País, quando o País é a geografia, a base física da Nação, portanto, do Estado.
É elementar: não existe Estado sem país, nem país sem geografia. Esta antinomia é fator de nosso atraso e de muitos de nossos problemas, pois somos um arquipélago social, econômico, ambiental e de costumes, não uma ilha.
A civilização e a grandeza do Brasil percorreram rotas centrífugas e não centrípetas.
Os bandeirantes não ficaram arranhando o litoral como caranguejos, na imagem pitoresca mas exata de Frei Vicente do Salvador. Cavalgaram os rios e marcharam para o oeste e para a História, na conquista de um continente.
Foi também indômita vocação federativa que inspirou o gênio do Presidente Juscelino Kubitschek, que plantou Brasília longe do mar, no coração do sertão, como a capital da interiorização e da integração.
A Federação é a unidade na desigualdade, é a coesão pela autonomia das províncias. Comprimidas pelo centralismo, há o perigo de serem empurradas para a secessão.
É a irmandade entre as regiões. Para que não se rompa o elo, as mais prósperas devem colaborar com as menos desenvolvidas. Enquanto houver Norte e Nordeste fracos, não haverá na União Estado forte, pois fraco é o Brasil.
As necessidades básicas do homem estão nos Estados e nos Municípios. Neles deve estar o dinheiro para atendê-las.
A Federação é a governabilidade. A governabilidade da Nação passa pela governabilidade dos Estados e dos Municípios.
O desgoverno, filho da penúria de recursos, acende a ira popular, que invade primeiro os paços municipais, arranca as grades dos palácios e acabará chegando à rampa do Palácio do Planalto.
A Constituição reabilitou a Federação ao alocar recursos ponderáveis às unidades regionais e locais, bem como ao arbitrar competência tributária para lastrear-lhes a independência financeira.
Democracia é a vontade da lei, que é plural e igual para todos, e não a do príncipe, que é unipessoal e desigual para os favorecimentos e os privilégios.
Se a democracia é o governo da lei, não só ao elaborá-la, mas também para cumpri-la, são governo o Executivo e o Legislativo.
O Legislativo brasileiro investiu-se das competências dos Parlamentos contemporâneos.
É axiomático que muitos têm maior probabilidade de acertar do que um só. O governo associativo e gregário é mais apto do que o solitário. Eis outro imperativo de governabilidade: a co-participação e a co-responsabilidade.
Cabe a indagação: instituiu-se no Brasil o tricameralismo ou fortaleceu-se o unicameralismo, com as numerosas e fundamentais atribuições cometidas ao Congresso Nacional?
A resposta virá pela boca do tempo. Faço votos para que essa regência trina prove bem.
Nós, os legisladores, ampliamos nossos deveres. Teremos de honrá-los. A Nação repudia a preguiça, a negligência, a inépcia. (Palmas.) Soma-se à nossa atividade ordinária, bastante dilatada, a edição de 56 leis complementares e 314 ordinárias. Não esqueçamos que, na ausência de lei complementar, os cidadãos poderão ter o provimento suplementar pelo mandado de injunção.
A confiabilidade do Congresso Nacional permite que repita, pois tem pertinência, o slogan: “Vamos votar, vamos votar”, que integra o folclore de nossa prática constituinte, reproduzido até em horas de diversão e em programas humorísticos.
Tem significado de diagnóstico a Constituição ter alargado o exercício da democracia, em participativa além de representativa. É o clarim da soberania popular e direta, tocando no umbral da Constituição, para ordenar o avanço no campo das necessidades sociais.
O povo passou a ter a iniciativa de leis. Mais do que isso, o povo é o superlegislador, habilitado a rejeitar, pelo referendo, projetos aprovados pelo Parlamento.
A vida pública brasileira será também fiscalizada pelos cidadãos. Do Presidente da República ao Prefeito, do Senador ao Vereador.
A moral é o cerne da Pátria.
A corrupção é o cupim da República. República suja pela corrupção impune tomba nas mãos de demagogos, que, a pretexto de salvá-la, a tiranizam.
Não roubar, não deixar roubar, pôr na cadeia quem roube, eis o primeiro mandamento da moral pública.
Pela Constituição, os cidadãos são poderosos e vigilantes agentes da fiscalização, através do mandado de segurança coletivo; do direito de receber informações dos órgãos públicos, da prerrogativa de petição aos poderes públicos, em defesa de direitos contra ilegalidade ou abuso de poder; da obtenção de certidões para defesa de direitos; da obtenção de certidões para defesa de direitos; da ação popular, que pode ser proposta por qualquer cidadão, para anular ato lesivo ao patrimônio público, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico, isento de custas judiciais; da fiscalização das contas dos Municípios por parte do contribuinte; podem peticionar, reclamar, representar ou apresentar queixas junto às comissões das Casas do Congresso Nacional; qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato são partes legítimas e poderão denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União, do Estado ou do Município. A gratuidade facilita a efetividade dessa fiscalização.
A exposição panorâmica da lei fundamental que hoje passa a reger a Nação permite conceituá-la, sinoticamente, como a Constituição coragem, a Constituição cidadã, a Constituição federativa, a Constituição representativa e participativa, a Constituição do Governo síntese Executivo-Legislativo, a Constituição fiscalizadora.
Não é a Constituição perfeita. Se fosse perfeita, seria irreformável. Ela própria,
com humildade e realismo, admite ser emendada, até por maioria mais acessível, dentro de 5 anos.
Não é a Constituição perfeita, mas será útil, pioneira, desbravadora. Será luz, ainda que de lamparina, na noite dos desgraçados. É caminhando que se abrem os caminhos. Ela vai caminhar e abri-los. Será redentor o caminho que penetrar nos bolsões sujos, escuros e ignorados da miséria.
Recorde-se, alvissareiramente, que o Brasil é o quinto país a implantar o instituto moderno da seguridade, com a integração de ações relativas à saúde, à previdência e à assistência social, assim como a universalidade dos benefícios para os que contribuam ou não, além de beneficiar 11 milhões de aposentados, espoliados em seus proventos.
É consagrador o testemunho da ONU de que nenhuma outra Carta no mundo tenha dedicado mais espaço ao meio ambiente do que a que vamos promulgar.
Sr. Presidente José Sarney: V.Exa. cumpriu exemplarmente o compromisso do saudoso, do grande Tancredo Neves, de V.Exa. e da Aliança Democrática ao convocar a Assembléia Nacional Constituinte. A Emenda Constitucional no 26 teve origem em mensagem do Governo, de V.Exa., vinculando V.Exa. à efemeridade que hoje a Nação celebra.
Nossa homenagem ao Presidente do Senado, Humberto Lucena, atuante na Constituinte pelo seu trabalho, seu talento e pela colaboração fraterna da Casa que representa.
Sr. Ministro Rafael Mayer, Presidente do Supremo Tribunal Federal, (palmas) saúdo o Poder Judiciário na pessoa austera e modelar de V.Exa.
O imperativo de “Muda Brasil”, desafio de nossa geração, não se processará sem o conseqüente “Muda Justiça”, (palmas) que se instrumentalizou na Carta Magna com a valiosa contribuição do poder chefiado por V.Exa. Cumprimento o eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal, Moreira Alves, que, em histórica sessão, instalou em 1o de fevereiro de 1987 a Assembléia Nacional Constituinte.
Registro a homogeneidade e o desempenho admirável e solidário de seus altos deveres, por parte dos dignos membros da Mesa Diretora, condôminos imprescindíveis de minha Presidência.
O Relator Bernardo Cabral foi capaz, flexível para o entendimento, mas irremovível nas posições de defesa dos interesses do País. O louvor da Nação aplaudirá sua vida pública.
Os Relatores Adjuntos, José Fogaça, Konder Reis e Adolfo Oliveira, (palmas) prestaram colaboração unanimemente enaltecida. Nossa palavra de sincero e profundo louvor ao mestre da língua portuguesa Prof. Celso Cunha, por sua colaboração para a escorreita redação do texto.
O Brasil agradece pela minha voz a honrosa presença dos prestigiosos dignitários do Poder Legislativo do continente americano, de Portugal, da Espanha, de Angola, Moçambique, Guiné Bissau, Príncipe e Cabo Verde. As nossas saudações.
Os Srs. Governadores de Estado e Presidentes das Assembléias Legislativas dão realce singular a esta solenidade histórica.
Os Líderes foram o vestibular da Constituinte. Suas reuniões pela manhã e pela madrugada, com autores de emendas e interessados, disciplinaram, agilizaram e qualificaram as decisões do Plenário. Os Anais guardarão seus nomes e sua benemérita faina.
Cumprimento as autoridades civis, eclesiásticas e militares, integrados estes com seus chefes, na missão, que cumprem com decisão, de prestigiar a estabilidade democrática.
Nossas congratulações à imprensa, ao rádio e à televisão. Viram tudo, ouviram o que quiseram, tiveram acesso desimpedido às dependências e documentos da Constituinte. Nosso reconhecimento, tanto pela divulgação como pelas críticas, que documentam a absoluta liberdade de imprensa neste País.
Testemunho a coadjuvação diuturna e esclarecida dos funcionários e assessores, abraçando-os nas pessoas de seus excepcionais chefes, Paulo Affonso Martins de Oliveira e Adelmar Sabino.
Agora conversemos pela última vez, companheiras e companheiros constituintes.
A atuação das mulheres nesta Casa foi de tal teor, que, pela edificante força do exemplo, aumentará a representação feminina nas futuras eleições.
Agradeço a colaboração dos funcionários do Senado – da Gráfica e do Prodasen.
Agradeço aos Constituintes a eleição como seu Presidente e agradeço o convívio alegre, civilizado e motivador. Quanto a mim, cumpriu-se o magistério do filósofo: o segredo da felicidade é fazer do seu dever o seu prazer.
Todos os dias, meus amigos constituintes, quando divisava, na chegada ao Congresso, a concha côncava da Câmara rogando as bênçãos do céu, e a convexa do Senado ouvindo as súplicas da terra, a alegria inundava meu coração.
Ver o Congresso era como ver a aurora, o mar, o canto do rio, ouvir os passarinhos.
Sentei-me ininterruptamente 9 mil horas nesta cadeira, em 320 sessões, gerando até interpretações divertidas pela não-saída para lugares biologicamente exigíveis. Somadas as das sessões, foram 17 horas diárias de labor, também no gabinete e na residência, incluídos sábados, domingos e feriados.
Político, sou caçador de nuvens. Já fui caçado por tempestades. Uma delas, benfazeja, me colocou no topo desta montanha de sonho e de glória.
Tive mais do que pedi, cheguei mais longe do que mereço. (Não apoiado.) Que o bem que os Constituintes me fizeram frutifique em paz, êxito e alegria para cada um deles.
Adeus, meus irmãos. É despedida definitiva, sem o desejo de retorno.
Nosso desejo é o da Nação: que este Plenário não abrigue outra Assembléia Nacional Constituinte. Porque, antes da Constituinte, a ditadura já teria trancado as portas desta Casa.
Autoridades, Constituintes, senhoras e senhores,
A sociedade sempre acaba vencendo, mesmo ante a inércia ou antagonismo do Estado.
O Estado era Tordesilhas. Rebelada, a sociedade empurrou as fronteiras do Brasil, criando uma das maiores geografias do Universo.
O Estado, encarnado na metrópole, resignara-se ante a invasão holandesa no Nordeste.
A sociedade restaurou nossa integridade territorial com a insurreição nativa de Tabocas e Guararapes, sob a liderança de André Vidal de Negreiros, Felipe Camarão e João Fernandes Vieira, que cunhou a frase da preeminência da sociedade sobre o Estado: “Desobedecer a El-Rei, para servir a El-Rei”.
O Estado capitulou na entrega do Acre, a sociedade retomou-o com as foices, os machados e os punhos de Plácido de Castro e dos seus seringueiros.
O Estado autoritário prendeu e exilou. A sociedade, com Teotônio Vilela, pela anistia, libertou e repatriou.
A sociedade foi Rubens Paiva, não os facínoras que o mataram.
Foi a sociedade, mobilizada nos colossais comícios das Diretas-já, que, pela transição e pela mudança, derrotou o Estado usurpador.
Termino com as palavras com que comecei esta fala: a Nação quer mudar. A Nação deve mudar. A Nação vai mudar.
A Constituição pretende ser a voz, a letra, a vontade política da sociedade rumo à mudança.
Que a promulgação seja nosso grito:
– Mudar para vencer!
Muda, Brasil!
Fonte
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