AFEGANISTÃO:
Caminho e casa de muitos.
Alguém razoavelmente bem informado por acaso achava que a chamada “construção da nação”, que os EUA se propunham a estabelecer no Afeganistão ocupado, passaria pelo respeito e pela mediação do conceito de autodeterminação dos povos? O “mundo livre” americano só existe da porta para dentro. O futuro do Afeganistão e de seu povo será o grande desafio dos povos de todo mundo, mas será, principalmente, o maior desafio do próprio povo afegão.
O que ele deixa de mencionar é que os EUA invadiram o Afeganistão em outubro de 2001 não apenas para combater o Talibã e a Al Qaeda. Eles prometeram ao povo afegão que iriam democratizar o país. Um dos principais argumentos para a ocupação era a proteção dos direitos das mulheres afegãs. Agora, quase 20 anos depois, fica claro que nunca se tratou das mulheres ou de democracia. Era tudo uma retórica vazia.(Waslat Hasrat-Nazimi 16/VIII/2021).

Saída dos EUA e novo governo do Talibã provoca mortes.
Cidadela de Herat
Uma antiga civilização na Rota da Seda entre o Oriente Médio, a Ásia Central e o Sul da Ásia, Herat serve como um centro regional no oeste do país, e suas históricas influências persas a destacam na paisagem e na cultura do pais.
Os primeiros registros de Herat aparecem na antiguidade, mas a data precisa de sua fundação é desconhecida. Sob o Império Persa Aquemênida (550–330 a.C.) (primeiro império Persa), o distrito ao redor era conhecido pelo nome persa antigo de Haraiva (𐏃𐎼𐎡𐎺), e em fontes clássicas a região era correspondentemente conhecida como Areia (Ária). Na coleção zoroastriana de Avesta, o distrito é conhecido como Haroiva. O nome do distrito e de sua cidade principal é derivado do rio local, o rio Herey (do iraniano antigo Harayu, que significa "com velocidade, rio veloz") (WP).
Talibã usa civis como escudo humano no Afeganistão.
O atual território do Afeganistão tem um histórico de ocupação milenar, já que a região é considerada um ponto estratégico, devido à sua posição geográfica, numa zona de transição e de movimentos migratórios em especial para o estabelecimento de rotas migratórias e comerciais entre Oriente e Ocidente.
Por esse motivo muitos exploradores e conquistadores, como persas, macedônios, turcos e mogóis (o império Mogol, Mugal ou Mogul, foi um Estado existente entre 1526 e 1857 que chegou a dominar quase todo o subcontinente indiano. Seu território de mais de quatro milhões de quilómetros quadrados, compreendia a maior parte do que é hoje a Índia, Paquistão, Afeganistão e Bangladexe.), ocuparam trechos do país ao longo dos períodos históricos.
Geografia física do Afeganistão
Geólogos americanos localizaram reservas de cobre, ferro, ouro, cobalto, nióbio e lítio, no país arrasado por sucessivas guerras. Em entrevista ao jornal americano The New York Times, o comandante das forças americanas no Iraque e no Afeganistão, general David Petraeus, disse que o potencial da descoberta é inestimável.(rfi)
Geologia do Afeganístão
Em 2010, geólogos norte-americanos anunciaram a “descoberta” de grandes depósitos de minerais estratégicos no Afeganistão. Dentre as “descobertas” anunciadas estão vastas reservas de cobre e lítio, minerais estratégicos para as indústrias de materiais elétricos, indústrias de equipamentos eletroeletrônicos e de comunicação.
O lítio, em especial, é um mineral absolutamente fundamental para o desenvolvimento atual de baterias elétricas, como a utilizadas nos celulares, aparelhos de MP3, notebooks e, mais recentemente, nos carros elétricos.
As maiores reservas atualmente conhecidas de Lítio localizam-se no altiplano boliviano. Além da Bolívia, Chile e Peru possuem algumas das maiores reservas de cobre do mundo, outro mineral fundamental para a indústria de materiais elétricos. Como vem sendo muito bem defendido por Fernando Sebben, a região central da América do Sul, incluindo Bolívia e Peru, teria um grande potencial de desenvolvimento associado à indústria da “Era da Informação”, caso estes recursos minerais fossem industrializados na região ao invés de exportados em estado bruto. (geopolitica)
O nome Afeganistão, em persa, significa "Terra dos Afegãos", que se origina a partir do etnônimo "Afegão". Historicamente, o nome "Afegão" designa as pessoas pachtuns, o maior grupo étnico do Afeganistão. Este nome é mencionado na forma de Abgan, no século III, em registros do Império Sassânida, como Avagana (afghana), no século VI, pelo astrônomo indiano Varahimira. Um povo chamado de Afegãos é mencionado várias vezes no século X, no livro de geografia Hudud Al-'Alam, principalmente quando ele faz referência a uma vila: "Saul, uma agradável vila nas montanhas. Onde vivem os Afegãos."
De 2.000 a.C. a 1.500 a.C. (aproximadamente), a região já servia de passagem para tribos indo-europeias que se dirigiam para o Punjabe através dos desfiladeiros do Indocuche. A palavra "Punjab" é uma combinação das palavras persas "punj" cinco, e "āb" água, que significa, literlamente, Terra dos cinco rios. Os cinco rios dos quais o Punjabe recebe o nome são o Jhelum, o Chenab, o Ravi, o Beas e o Sutlej, todos eles afluentes do rio Indo. Do século VI a.C. ao século IV a.C. tornou-se parte do Império Aquemênida e subdividido nas províncias de Drangiana, Ária e Aracósia.
O Afeganistão faz fronteira com o Paquistão ao sul e ao leste, com o Irã ao oeste, com o Turcomenistão, Uzbequistão e Tajiquistão ao norte e com China no nordeste. Ocupando 652 230 km², sendo o 41º maior do mundo em área, o Afeganistão é predominantemente montanhoso, com planícies no norte e sudoeste. Cabul é a capital e a maior cidade, com uma população estimada em 4,6 milhões, sendo o 37.º país mais populoso do mundo, composta principalmente de etnias pachtuns, tajiques, hazaras e usbeques.
História moderna
O período moderno do Afeganistão tem início no século XIX, por meio da invasão do Império Britânico ao sul. A Grã-Bretanha ocupou parte da região até meados do século XX.
Em 1823 foi oficialmente fundado o Emirado do Afeganistão. Tudo começou com um levante dos povos locais contra os persas em 1709 lutando por independência.
No século XIX o Afeganistão era o sonho de consumo das duas grandes potências europeias: Império Russo e o Império Inglês através de Índia britânica.
O império Russo em expansão dominava vastos territórios asiáticos e tentava expandir-se para o sul, e a Inglaterra que dominava a Índia queria expandir seus domínios em direção ao norte.
Depois de três tentativas frustradas de invadir o Afeganistão, a Inglaterra desiste desse plano e assina um tratado que reconhecia o Afeganistão como país independente em 1919. Entretanto, mesmo com a independência não veio à esperada estabilidade e o desenvolvimento econômico e social.
O Afeganistão é um país constituído por regiões isoladas entre si por cadeias de montanhas e vales. Originariamente constituído por muitas etnias diferentes de culturas e religiões distintas. Na época de sua independência, o país já era majoritariamente islâmico e grande parte das tribos afegãs se mantiveram fieis às tradições islâmicas.
Logo após a independência, foi instituída uma monarquia no país, sendo substituída por um regime republicano, no ano de 1973.
O Afeganistão é um país constituído por regiões isoladas entre si por cadeias de montanhas e vales. Originariamente constituído por muitas etnias diferentes, praticas culturais e religiosas também distintas.
Mesmo à época da independência, o país já era majoritariamente islâmico. Boa parte das tribos afegãs se mantiveram fieis às tradições islâmicas.
Etnias afegãs
Como o Taleban se sobrepõe à etnia.
Isso é para sublinhar o grau em que a guerra atual do Afeganistão (a guerra que começou quando os EUA e aliados invadiram em 2001, não a guerra de 1979 a 1989 contra os soviéticos ou as guerras civis de 1989 a 2001) e não é sobre etnia. O Talibã se sobrepõe amplamente, mas não exclusivamente, aos pashtuns no sul e no leste. Isso é especialmente importante porque há tantos pashtuns do outro lado da fronteira com o Paquistão, onde o Talibã tem grandes bases de operação. Mas, além do Taleban, existem grupos rebeldes, nem todos pashtuns. Geralmente, porém, o norte do país é mais estável e menos violento do que o sul ou o leste. (vox).
Etnias afegãs
Pashtuns
Principal etnia do Afeganistão, com 42% da população, os pashtuns são, principalmente, muçulmanos sunitas e falam pashto, ou pashtun. Desde o século XVIII, costumam controlar o Estado e o Exército. Os talibãs, que tomaram o poder pela segunda vez após seu regime de 1996-2001, são um grupo predominantemente pashtun. Os dois presidentes do governo apoiado pelos Estados Unidos, Hamid Karzai e Ashraf Ghani, também são deste grupo étnico.
Tadjiques
Os Tadjiques são o segundo grupo étnico do país, e representam por volta de 27% da população. Falam a língua dari (farsi, em persa). Estão localizados, principalmente, no norte e no oeste do país, com bastiões no vale de Panshir (província que resistiu à invasão soviética e ao primeiro governo Talibã), na cidade de Herat no oeste e em algumas províncias do norte.
Hazaras
A etnia Hazaras, representam cerca de 9% da população afegã e falam um dialeto dari, são considerados originários da Ásia Central e dos povos turcos. Vivem, principalmente, no centro do país. É uma minoria xiita, que sofre grande perseguição há séculos, bem como também é perseguido pelo talibãs, que os consideram hereges. Este grupo também foi alvo de ataques do grupo jihadista Estado Islâmico.
Uzbeques
Etnia Uzbeque também representa 8% da população e se encontra, sobretudo, no norte do país, ao longo da fronteira com o Uzbequistão. São sobretudo muçulmanos sunitas, mantêm fortes vínculos linguísticos e culturais com a Turquia. O senhor da guerra Abdul Rashid Dostom, desta etnia, é suspeito de ter ordenado o massacre, em 2001, de centenas, talvez milhares, de prisioneiros talibãs.
Além destas o Afeganistão também apresenta ainda outras etnias como os Turcomanos, os Quirguizes, os Cazaques, os Baluchis e Nuristaneses, anteriormente chamados de "kafir" (infiéis) até sua conversão forçada no século XIX; que perfazem juntas em torno de 14% da população. (em)
Constituição étnica da população Afegã.
Contexto do sec. XX
A maioria dos países europeus ficaram praticamente destruídos devido II Guerra Mundial (1939-1945). Já os EUA saíram ilesos da guerra com seu parque industrial muito aumentado e capacitado e sua economia fortalecida, isso por entrarem na guerra já no final e por estarem distante do teatro da ação. Dessa forma, passaram a abastecer o mercado mundial, não só com bens de consumo mas com armas, a expandir sua influencia e a auxiliar financeiramente esses países devastados. Como consequência, se tornaram a maior potência do mundo capitalista.
A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), contudo, tornou-se a segunda maior potência mundial e auxiliava política e economicamente os países do Leste Europeu. Assim, estendia sua influência à alguns países da Ásia como o Afeganistão desde a proclamação da sua república, em 1978.
Os EUA e a URSS eram adversários desde a década de 1950 nunca chegando a se enfrentar diretamente em campo de batalha. Desde então o período do pós segunda guerra até a queda da URSS, onde ambos (Russia e EUA) travam disputas ideológicas é conhecido como período da Guerra Fria. Contudo ambas potencias travam "guerras por procuração" (proxi war) em diversas frentes no mundo.
Em 1979, é deflagraram uma guerra civil entre vários grupos afegãos. Um grupo era aliados do marxismo-leninismo e o outro grupo formado por religiosos tradicionais, que contrários a qualquer ideologia estrangeira principalmente ateístas.
A invasão soviética em 1979
A guerra de 1989 que rasgou o Afeganistão.
Em 1979, a União Soviética invadiu o Afeganistão para defender o governo comunista pró-Moscou das crescentes rebeliões. Os EUA (junto com a Arábia Saudita e o Paquistão) financiaram e armaram os rebeldes. A CIA deliberadamente escolheu financiar extremistas, vendo-os como melhores lutadores. Quando os soviéticos recuaram em 1989, esses grupos rebeldes se voltaram uns contra os outros e contra os EUA que os treinou e financiou, travando uma horrível guerra civil que você pode ver neste mapa: as áreas vermelhas estavam, a partir de 1989, sob controle do governo. Todas as outras cores mostram áreas de controle de um grupo rebelde. Alguns desses rebeldes, como o Hezb-i Islami Gulbuddin, ainda estão lutando, embora a maioria deles tenha sido derrotada quando o Talibã se levantou e conquistou o país na década de 1990. (vox)
Assim, a União Soviética interveio no conflito por considerar o Afeganistão dentro de sua área de influência, apoiando o governo central do Afeganistão pró marxista, progressista e interessado em reformas estruturantes, invadindo o território afegão. As tropas soviéticas deixaram o país somente em 1989. A saída da URSS deixou um vácuo de poder no cenário político do Afeganistão, que foi ocupado por meio da ascensão de grupos extremistas, em especial o Talibã, financiados pela Arábia Saudita.
As relações entre Afeganistão e Arábia Saudita são relações diplomáticas estabelecidas entre a República Islâmica do Afeganistão e o Reino da Arábia Saudita.
Contudo, os laços da Arábia Saudita com o Afeganistão que vieram à tona a partir de 11 de setembro de 2001, sendo anteriores aos ataque da Al-Qaeda, no EUA, mostrando uma relação mais antiga no tempo.
A relação entre Afeganistão e Arábia Saudita iniciou-se bem antes de 11 de setembro de 2001, (anteriores aos ataque da Al-Qaeda, no EUA).
Essas relações vinham do final da década de 1980 ainda no contexto da guerra fria, quando a Arábia Saudita, juntamente com os Estados Unidos, e Paquistão, deram apoio ao movimento de resistência afegão contra a ocupação da União Soviética.
Soldado afegão entrega uma bandeira a um soviético em maio de 1988 por ocasião da retirada do Exército de Cabul (todamateria)
A Arábia Saudita forneceu combustível e auxílio em dinheiro diretamente para os afegãos, e a agência secreta de inteligência do Paquistão (ISI) forneceu suporte técnico e pessoal treinado.
O saudita Osama bin Laden, o principal organizador dos ataques terroristas ao World Trade Center e chefe da Al-Qaeda, teve seu refúgio concedido pelos Talibãs no Afeganistão.
O Afeganistão é de fato governado pelo Emirado Islâmico do Afeganistão, o Taliban.
O Emirado Islâmico do Afeganistão foi estabelecido pela primeira vez em setembro de 1996 pelos Talibãs, uma organização islâmica Deobandi que iniciou a governar o Afeganistão após a queda de Cabul em 1996. (Essa organização é um movimento de revitalização do islamismo dentro do Islã que se formou no final do século XIX em torno do seminário islâmico Darul Uloom na cidade de Deoband, Índia, de onde o nome deriva).
Em 2001, os Estados Unidos invadiram o Afeganistão com o pretexto de que estavam a procura de Osama Bin Laden. A coalizão liderada pelos EUA tirou o Talebã do poder e expulsou a Al-Qaeda temporariamente do país.
Em 2001, o Talibã foi derrubado por uma coligação militar liderada pelos Estados Unidos, que invadiu o país após os ataques de 11 de Setembro, em busca de terrorizas da Al-Qaeda, desencadeando a guerra e uma ocupação de 20 anos. Com a decisão do presidente Joe Biden dos EUA, de retirar as tropas norte-americanas da região, o Talibã regressou ao poder após a partida da maioria das forças da OTAN, o que levou a tomada da capital Cabul em Agosto de 2021.
Mesmo derrotado, o Talebã na prática continuou exercendo influência sobre boa parte do país (leste e sul).
A bem da verdade os EUA nunca tiveram o controle real do país como um todo. O controle do exército norte-americano se resumia à capital é a regiões próximas dali. Confrontos entre milícias e soldados norte-americanos nunca deixaram de acontecer ao longo desses vinte anos de invasão americana.
O custo da invasão ocupação
O custo dessa operação militar que durou 20 anos foi astronomicamente alto, em vidas e em dinheiro.
Mais de 2,3 mil militares americanos foram mortos e mais de 20 mil foram feridos.
Mais de 450 britânicos morreram, assim como centenas de soldados de outras nacionalidades.
Mas foram os afegãos que sofreram o maior impacto. Houve mais de 60 mil mortes nas forças de segurança e quase o dobro de mortes de civis.
O custo financeiro estimado para o contribuinte norte-americano foi de quase 1 trilhão de dólares.
Mortes nos 20 anos de invasão dos EUA ao Afeganistão
(brasildefato)
As partes mais importantes da Guerra do Afeganistão, em um mapa.
A Guerra do Afeganistão é extremamente complicada, mas este mapa faz um trabalho notável de capturar os componentes mais importantes: 1) as áreas do Taliban, em sobreposição laranja; 2) as áreas controladas pelos EUA e aliados, em manchas verdes (insignificante); 3) as principais bases militares ocidentais, marcadas com pontos azuis; 4) as áreas de produção de ópio, que são uma grande fonte de financiamento do Taleban, em círculos marrons, com círculos maiores significando mais ópio; 5) as linhas de abastecimento através do Paquistão, em vermelho, que o Paquistão fecha ocasionalmente e está sob freqüente ataque do Taleban; 6) a linha de abastecimento através da Rússia, que requer aprovação russa. (vox)
LINHA DO TEMPO
(bbc)
Datas importantes na história do Afeganistão
Antiguidade - O território atual do Afeganistão foi dominado por diferentes povos e impérios, como a Babilônia e o macedônio Alexandre, o Grande.
Século 7 - Primeiras invasões árabes, aos poucos levando o islã à região.
1838-42 - Forças britânicas invadem o Afeganistão e colocam no poder o rei Shah Shujah - que é assassinado em 1842. Tropas britânicas e indianas são massacradas enquanto se retiravam de Cabul.
1878-80 - Segunda guerra anglo-afegã. Um tratado dá ao Reino Unido o controle sobre as relações exteriores do Afeganistão.
1919 - O emir Amanullah Khan declara independência da influência britânica.
1926-29 - Amanullah tenta introduzir reformas sociais, que provocam protestos e o levam a fugir do país.
1933 - Zahir Shah torna-se rei, iniciando um período em que o Afeganistão permanece uma monarquia por quatro décadas.
1953 - General Mohammed Daud torna-se primeiro-ministro e procura a União Soviética para assistência militar e econômica. Daud introduz reformas sociais, incluindo a abolição do purdah, a prática de isolar mulheres.
1963 - Daud é forçado a renunciar ao cargo de premiê.
1964 - Introdução da monarquia constitucional, o que leva à polarização política uma disputa pelo poder.
1973 - Mohammed Daud toma o poder num golpe de Estado e declara a transformação do Afeganistão numa república. Daud tenta jogar a URSS contra potências ocidentais.
1978 - Daud é derrubado e morto num golpe a favor da União Soviética. O Partido Popular Democrático toma o poder, mas é paralisado por violentas disputas internas, além de enfrentar a oposição de grupos de guerreiros mujahideen apoiados pelos Estados Unidos.
1979 - Em dezembro, o Exército soviético invade o país e coloca no poder um governo comunista. No ano seguinte, Babrak Karmal é instalado como governante, com o apoio das tropas soviéticas. A oposição, porém, aumenta, com vários grupos de mujahideens lutando contra as forças soviéticas. Os EUA, o Paquistão, a China, o Irã e a Arábia Saudita enviam dinheiro e armas aos mujahideen.
1986 - Karmal é substituído no poder por Mohammad Najibullah, novo chefe do regime apoiado pela União Soviética.
1988 - Afeganistão, URSS, EUA e Paquistão assinam acordos de paz. A União Soviética começa a retirar suas tropas do país.
1989 - As últimas tropas soviéticas deixam o Afeganistão, mas uma guerra civil continua, com os mujahideen forçando a derrubada de Najibullah.
1992 - O governo de Najibullah é derrubado, mas uma devastadora guerra civil se segue.
1996 - O grupo radical Talebã toma o controle da capital, Cabul, e introduz uma versão extrema do Islã, banindo as mulheres do mercado de trabalho e introduzindo punições islâmicas, como a morte por apedrejamento e amputações. Combatentes do Talebã tomam Najibullah, que se encontrava havia anos refugiado numa base da ONU, e o torturam até matá-lo.
1997 - O Talebã , que agora controla dois terços do território do país, é reconhecido como governo afegão legítimo pelo Paquistão e pela Arábia Saudita.
1998 - Os EUA lançam ataques a mísseis contra supostas bases do militante Osama bin Laden, acusado de organizar as explosões de embaixadas americanas na África.
1999 - A ONU impõe um embargo aéreo e sanções financeiras para forçar o Afeganistão a entregar Osama bin Laden para ser julgado.
2001 - Em março, o regime do Talebã, liderado pelo mulá Mohammed Omar, destroi duas grandes estátuas de Buda do século 6 no vale de Bamyan, no centro do país. Em setembro, Ahmad Shah Masood, líder da principal oposição ao Talebã, a Aliança do Norte, é assassinado.
2001 - Outubro - Início do bombardeio do Afeganistão pelos EUA depois dos atentados de 11 de setembro. Forças da Aliança do Norte entram em Cabul pouco depois. Em dezembro, grupos afegãos fazem um acordo, em Bonn, na Alemanha, pela formação de um governo interino. Hamid Karzai assume como chefe de um governo interino de coalizão.
2002 - Em abril, o ex-rei Zahir Shah volta ao país, mas não reivindica direito ao trono. Shah morre cinco anos depois.
2003 - Em agosto, a Otan (aliança militar ocidental) assume o controle da segurança em Cabul, a primeira vez em que a organização assume uma responsabilidade operacional fora da Europa.
2004 - Em janeiro, a Loya Jirga adota uma nova Constituição, que prevê uma Presidência fortalecida. Em outubro e novembro, ocorrem eleições presidenciais, em que Hamid Karzai é declarado o vencedor.
2005 - Em setembro, afegãos votam na primeira eleição parlamentar em mais de 30 anos.
2008 - O presidente americano, George W. Bush, envia em setembro mais 4.500 soldados ao país, num movimento descrito na época como uma escalada discreta.
2009 - Eleições provinciais e presidencial de agosto são marcadas por uma onda de ataques do Talebã, participação baixa e acusações de fraude. Em outubro, Karzai é declarado vencedor, depois que Abdullah Abdullah retira-se da disputa, antes do segundo turno.
2009 - Dezembro - O presidente americano, Barack Obama, aumenta o contingente no Afeganistão em 30 mil soldados, elevando o total a 100 mil. Obama diz que os EUA começarão a retirar suas tropas em 2011.
2010 - Forças da Otan lançam uma grande ofensiva em fevereiro, a Operação Moshtarak, numa tentativa de assegurar o controle pelo governo da província de Helmand, no sul. Em julho, o site Wikileaks publica milhares de documentos militares confidenciais dos EUA relacionados ao Afeganistão.
2011 - Em fevereiro, a entidade Afghanistan Rights Monitor informa que o número de civis mortos desde a invasão de 2001 atingiu níveis recordes em 2010.
2013 - Em junho, o Exército afegão assume o controle de todas as operações militares e de segurança no país, que estavam sob o comando da Otan.
2014 - Os dois adversários na disputa presidencial, Ashraf Ghani e Abdullah Abdullah, assinam um acordo de compartilhamento de poder, depois de uma auditoria de dois meses dos resultados das eleições. Ghani assume como presidente.
2014 - Dezembro - A Otan oficialmente encerra seus 13 anos de missões de combate no Afeganistão, entregando o comando às forças afegãs. A violência no país, no entanto, persiste, e 2014 é considerado o ano mais sangrento desde a invasão de 2001.
2015 - O grupo autodenominado Estado Islâmico (EI) emerge no leste do Afeganistão e, em poucos meses, captura boa parte das áreas controladas pelo Talebã na província de Nangarhar.
2016 - Em julho, o presidente Barack Obama diz que 8.400 soldados americanos permanecerão no Afeganistão ao longo de 2017 diante da "precária situação de segurança" no país. A Otan também concorda em manter tropas no país e reitera sua promessa de financiamento de forças de segurança locais até 2020.
2017 - O presidente americano, Donald Trump, anuncia o envio de tropas adicionais para combater uma ressurgência do Talebã.
2019 - Negociações entre o Talebã e os EUA chegam ao fim sem um acordo.
2020 - Em fevereiro, os Estados Unidos assinam acordo com o Talebã que prevê a retirada das tropas estrangeiras do território afegão em 14 meses. Em troca, o Talebã se compromete a cortar os laços com o grupo radical al-Qaeda.
2021 - Em meados de abril, o presidente americano, Joe Biden, disse que a retirada das tropas dos EUA começaria em maio e estaria concluída em 11 de setembro, aniversário de 20 anos dos ataques às torres gêmeas do World Trade Centre.
2021 - Em agosto, simultaneamente à saída dos soldados americanos, militantes do Talebã começam a tomar o contrle de importantes cidades do Afeganistão. O progresso do grupo é extremamente rápido forçando os EUA a acelerarem a retirada das tropas. Em 15 de agosto, o Talebã entra em Cabul e toma o palácio do governo, após a fuga do então presidente Ashraf Ghani.
2021 - Milhares de afegãos tentam desesperadamente deixar o país.
Consequências da guerra no Afeganistão
A Guerra do Afeganistão continua até os dias de hoje.
Desde então, a ONU tem feito grandes esforços em busca da paz. O trabalho da ONU consiste em tentar erradicar o terrorismo e fornecer ajuda humanitária aos afegãos.
Queda do IDH
Aumento da mortalidade infantil.
Aumento da fome na população.
Atualmente, grande parte da população morre de fome ou por falta de cuidados médicos, pois a infraestrutura do país ainda não foi reconstruída.
Para além da miséria do povo afegão, esta guerra teve como consequência milhares de mortes, problemas psicológicos dos militares e bilhões gastos em armamento.
Bandeira do Afeganistão
O Talibã e a hipocrisia do “mundo livre”
Uma análise em profundidade sobre as origens da crise afegã. O papel da CIA na expansão do grupo fundamentalista durante a Guerra Fria. O governo talibã de 1996. O drama da população, acossada por guerras, ocupação e extremismos.
(Boges, 18/VIII/2021) Eduardo Borges (Geopolítica e guerra)
O grupo Talibã voltou a povoar os corações e mentes da imprensa brasileira. Uma plêiade de “especialistas”, boa parte deles devidamente imbuídos de adequar suas respectivas “análises” ao nosso momento político, apresentam versões do fato sem levar em conta toda a complexidade histórica que envolve este evento. As análises muito pouco conseguem alcançar a amplitude teórica e conceitual que envolve a crise política e social de uma região do mundo cuja histórica formação social não se deu com base em valores e ações presentes no conceito de evolução histórica do mundo ocidental.
O entendimento da complexidade que caracteriza o atual conflito afegão deve, necessariamente, partir da compreensão de sua importância geopolítica na região. Formado por cadeias de montanhas o território afegão não é presa fácil para seus invasores que o diga Alexandre Magno no século IV a.C. No interior das relações políticas e econômicas da Ásia o Afeganistão se firmou como ponto estratégico de rotas comerciais no continente. Suas fronteiras também colaboraram para colocá-lo em constante condição de vulnerabilidade na medida em que teve que lidar permanentemente com vizinhos do quilate do Paquistão e seu arsenal nuclear, da Índia, da China e do Irã, país que teria sobre ele impacto direto em termos religiosos e culturais.
Tudo isto fez do Afeganistão um dos territórios mais invadidos da história. Desde Alexandre Magno no século IV a.C., a região sofreria invasão dos árabes durante a dinastia Abássida e dos mongóis sob Genghis Khan. Nos séculos XIX e XX foi a vez do imperialismo inglês colocar suas garras na região através da Índia, na época território britânico. No final dos anos setenta do século XX, em plena Guerra Fria, coube à União Soviética implementar a primeira grande investida imperialista sobre o Paquistão em tempos modernos.
A invasão soviética redesenhou as relações políticas das duas potencias mundiais (URSS e EUA) na região e estabeleceu o ponto de partida das inúmeras investidas equivocadas do imperialismo americano. É impossível debater o Talibã, sem compreender primeiro as ações do imperialismo americano em meio à disputa da hegemonia política e econômica mundial. Não obstante a condenável ação soviética sobre o Afeganistão, não cabia aos EUA se aproveitar oportunisticamente para fincar seus pés no país. Aqui resgatamos o conceito de autodeterminação dos povos que geralmente é estrategicamente esquecido pelos tendenciosos analistas de plantão. Na ânsia de afastar os soviéticos, os americanos não se furtaram em colocar em prática aquilo que eles mais sabem fazer em termos de relações internacionais: armar e treinar seus futuros inimigos. O maquiavelismo de que os fins justificam os meios é frase estampada em todos os escritórios da CIA pelo mundo.
No tempo da invasão soviética a CIA abriu os cofres para os radicais islâmicos, os mujahidins, canalizando suas ações contra o invasor. Por tabela, acabou ajudando, mesmo que indiretamente, a um sujeito chamado Osama Bin Laden que buscava se firmar como liderança na região. Osama tinha muito boas relações com o líder mujahidins Jalaluddin Haqqani. É neste contexto que o Talibã se firma como combatente aliado dos americanos se beneficiando da enxurrada de dólares derramado na “Guerra Justa” dos jihadistas afegãos. No mesmo período, em 1980, a revolução islâmica acontecida no Irã sob a liderança do aiatolá Khomeini, e que derrubou o Xá Reza Pahlevi (aliado dos EUA), faria os americanos armarem um político iraquiano que se firmava como grande liderança local, seu nome: Saddam Hussein. O que vem em seguida é história.
Uma das consequências do apoio americano ao Talibã, que também é negligenciado pelos analistas atuais, foi a afirmação do fundamentalismo islâmico como base moral da sociedade. Naquele momento, para os americanos, isto era o que menos importava. Em 1977 através da chamada “Operação Fair Play” o Chefe do Estado Maior do Paquistão General Muhammad Zia-ul-Haq desencadeou um golpe de estado e assumiu o poder no país. O governo de Zia-ul-Haq foi extremamente violento contra a oposição, impôs um regime de terror baseado no fundamentalismo islâmico e aliado a grupos também fundamentalistas como o Talibã, todos eles devidamente encorpados com os dólares do tio Sam. Quanto à posição do “mundo livre” em relação à ditadura de Zia-ul-Haq, não enxergou grandes problemas, desde que ele fizesse o trabalho sujo contra os soviéticos continuaria sendo agraciado com ajuda econômica.
Entre os grupos fundamentalistas que se formaram no contexto da disputa entre americanos e soviéticos o Talibã, que significa “estudantes”, se firmou como o mais poderoso depois de anos de disputas internas entre as diversas facções étnicas paquistanesas. Em 1996, sob a liderança de Mahammed Omar, o Talibã chegou ao poder estabelecendo o Emirado Islâmico do Afeganistão. Iniciou um processo de imposição de poder com base em rígidas normas de condutas morais e apesar de contar, inicialmente, com algum apoio popular, foram se desgastando na medida em que impunham ações violentas contra os direitos humanos e supressão de liberdades. As mulheres foram as que mais sofreram sendo proibidas de frequentar a escola ou trabalhar fora de casa.
É certo que a partir de 1996, quando as ações condenáveis do talibã contra a população afegã ganharam o mundo, o grupo teve que conviver com fortes reações internacionais. Em 1997 Osama Bin Laden firmou seu centro de comando em Kandahar vinculando-se definitivamente ao Afeganistão. Para os EUA, os ex-aliados tinham se transformados em perigosos terroristas. Mas ainda faltava um pavio curto para iniciar o incêndio e ele veio em 11 de setembro de 2001.
O maior atentado da história americana exigia rapidamente que se encontrasse o responsável. À rede Al Qaeda, liderada por Osama Bim Laden, foi atribuída a responsabilidade pelo atentado. Osama atuava desde o Afeganistão e sua conexão com o Talibã foi imediata. Para os EUA, derrubar Osama passava por derrubar o Talibã e consequentemente invadir o Paquistão. Em outubro de 2001 uma coalizão militar liderada pelos Estados Unidos da América invadiu o Afeganistão e botou para correr as lideranças do talibã, entre eles o próprio Mohammed Omar, o país passaria ao controle americano em dezembro deste mesmo ano. Assim começava a saga de americanos e Talibãs pelos últimos vinte anos.
Entre 2001 e 2021 o mundo acompanhou de perto esta saga que se mostrou sangrenta e violenta para a população do Afeganistão. A guerra não foi diferente para milhares de jovens americanos que tiveram suas vidas físicas e psicológicas destruídas de forma cruel. O Talibã, afastado do poder, nunca esteve verdadeiramente abatido. Manteve-se na ativa desempenhando o que mais sabe fazer, usar a geografia do país para impor sua guerra de guerrilha entre as montanhas. A um custo de US$ 2 trilhões a presença americana não só não cumpriu com seus objetivos ditos democráticos como desencadeou a morte de milhares de civis e destruiu o futuro de milhões de pessoas. Em 2012, o Talibã seguia tentando fragilizar a presença ocidental na região e promoveu um ato que marcou os anos de conflito. A estudante Malala Yousafzai sofreu um atentado no Paquistão ao denunciar à imprensa internacional a violência causada pelo Talibã na região. Malala sobreviveu e recebeu o prêmio Nobel da Paz.
A presença ocidental no Afeganistão somente serviu para demonstrar a incompetência de militares americanos e britânicos em termos de análises de médio e longo prazo. Não aprenderam com o passado (vide Alexandre Magno) e negligenciaram a experiência de guerrilha do Talibã e o conhecimento do terreno inóspito. Uma guerra como esta até teria uma causa inicial, mas, definitivamente, era impossível saber somo se daria o final. O imperialismo ocidental foi completamente arrogante e hoje, passados vinte anos, paga o preço. Entraram em uma guerra “sem fim” contra um inimigo cujos limites não são pautados pela lógica das limitações e das fraquezas ocidentais. Queriam combater o terrorismo, mas só o ampliaram.
A “vitoriosa” invasão ocidental no Afeganistão foi a grande ilusão bélica do século XXI. O Estado colocado no lugar pelos invasores não conseguiu se estabelecer com o mínimo de respaldo popular. A corrupção manteve-se mediando as relações de poder e a violência transformou-se em ação do cotidiano. O capitalismo imperialista americano, sempre muito arrogante, se mostrou débil e incompetente. Novos atores como China, Rússia e Irã, buscam se aproximar do conflito e se beneficiarem política e economicamente da tragédia humana vivenciada pelo país. Em meio a este conflito de “abutres” sofre passivamente a classe trabalhadora paquistanesa. É o sistema-mundo capitalista reorganizando suas posições entre o centro e a periferia do sistema.
Quando em 29 de fevereiro de 2020, sob o governo de Donald Trump, houve o aperto de mãos entre Abdul Ghani Baradar, líder da delegação do Talibã, e Zalmay Khalilzad, enviado dos EUA para a paz no Afeganistão a guerra iniciada em 2001, como uma ação cirúrgica e competente dos EUA, chegava ao fim de maneira melancólica para o imperialismo americano. Para as relações internacionais, um novo mundo se abriu em termos de ações intervencionistas entre estados soberanos. O agora fugitivo presidente afegão Ashraf Ghani não participou da “festa” em Doha, no Catar, em fevereiro de 2020. O imperialismo optou em “falar” com quem realmente manda. O governo Trump assumiu a obrigação de retirar suas tropas em 14 meses. Biden concluiu o processo de forma meio abrupta nesse fatídico agosto de 2021. Os americanos calcularam mal tanto a entrada quanto a saída.
O acordo de Doha previa que a Al-Qaeda não teria o respaldo do Talibã. Os Estados Unidos levaram 20 anos e muitas mortes de inocentes para conseguirem fechar, em um acordo festivo, a ferida do 11 de setembro de 2001. O todo poderoso secretário de Estado de Trump, Mike Pompeo, demonstrou toda abnegação ocidental diante dos “terroristas” islâmicos: “O Talibã mostrou, no período de redução de violência, que tem disposição de ser pacífico”.
No dia 15 de agosto o Talibã entrou em Cabul, capital do Afeganistão, e deu sua resposta ao Ocidente e a Pompeo. Washington se mostrou atordoado e os seguidores de Joe Biden e Donald Trump iniciaram uma pequena e particular “Guerra Fria” ideológica que somente serve para expor as mazelas do imperialismo americano. Funcionários da embaixada americana em Cabul arriaram a bandeira e deixaram às pressas a capital. Outros governos estão fazendo o mesmo com seus cidadãos. O último que sair apague a luz.
O que fica é um rastro de sangue, tristeza e morte. A população afegã, principalmente sua classe trabalhadora, aquela que verdadeiramente sofreu com a ocupação americana pagando com a vida a completa falta de possibilidade de cidadania, vai seguir a mercê da vontade e da ganância do capitalismo mundial e do fundamentalismo do Talibã. O Conselho de Segurança da ONU resolveu aparecer depois de anos de subserviência à arrogância do imperialismo americano. Alguém razoavelmente bem informado por acaso achava que a chamada “construção da nação”, que os EUA se propunham a estabelecer no Afeganistão ocupado, passaria pelo respeito e pela mediação do conceito de autodeterminação dos povos? O “mundo livre” americano só existe da porta para dentro. O futuro do Afeganistão e de seu povo será o grande desafio dos povos de todo mundo, mas será, principalmente, o maior desafio do próprio povo afegão. Definitivamente, este não é um tema para incautos e amadores.
Terrorismo é lucro
Chega de hipocrisia em relação ao Afeganistão
(Inspirado em Waslat Hasrat-Nazimi)
Mal as tropas americanas tinham se retirado, e as coisas se desenrolaram muito rapidamente. Em poucos dias, o Talibã invadiu uma província após a outra. Como dominós, as capitais provinciais caíram. Milhares de afegãs e afegãos fugiram na esperança de encontrar abrigo seguro na capital, Cabul, – em vão. Agora também Cabul está nas mãos do Talibã
No Ocidente, as pessoas observam, em parte espantadas e em parte estupefatas, como, dentro de poucos dias, a República Islâmica do Afeganistão é transformada num emirado islâmico. Recebo repetidamente mensagens e telefonemas de conhecidos e colegas expressando sua solidariedade. Um colega da redação árabe da DW diz não saber exatamente por que, mas o que está acontecendo o afeta incrivelmente.
A grande mentira da missão no Afeganistão
A razão pela qual muitos estão chocados é que estão começando a perceber que seus governos não invadiram o Afeganistão 20 anos atrás para defender os direitos humanos, mas somente por interesses políticos. Como os interesses políticos mudaram, uma vez que o cálculo do custo-benefício não funciona mais, eles querem sair do país, e o mais rápido possível. Era tudo uma grande mentira. Direitos humanos? Direitos da mulher? Democracia? Deixe os afegãos resolverem isso por si mesmos, disse recentemente o presidente americano, Joe Biden. Ele disse que não passaria a missão, que foi liderada por quatro presidentes sucessivos dos Estados Unidos, a um quinto.
O que ele deixa de mencionar é que os EUA invadiram o Afeganistão em outubro de 2001 não apenas para combater o Talibã e a Al Qaeda. Eles prometeram ao povo afegão que iriam democratizar o país. Um dos principais argumentos para a ocupação era a proteção dos direitos das mulheres afegãs. Agora, quase 20 anos depois, fica claro que nunca se tratou das mulheres ou de democracia. Era tudo uma retórica vazia.
As mesmas mulheres que foram aplacadas quando alegadamente se levantaram com demasiada veemência por seus direitos e a quem foi prometido que a democracia e o Estado de direito sempre venceriam no final são agora jogadas de volta à escuridão de 20 anos atrás. Elas foram traídas e vendidas. Muitas ativistas dos direitos das mulheres temem por suas vidas.A mesma hipocrisia pode ser vista na política de refúgio da União Europeia (UE) e da Alemanha. Afegãs e afegãos estão fugindo de seu país de origem há muitos anos. Não é fácil para ninguém deixar sua terra natal. Eles fogem porque a situação de segurança no Afeganistão foi se deteriorando cada vez mais.
Refugiados precisam ser acolhidos
Tudo isso foi ignorado. O Afeganistão foi classificado como "seguro". Muitos refugiados foram deportados, outros apenas tolerados. Milhares de afegãos vivem sob condições desumanas na Grécia, Turquia ou nos Bálcãs. Os políticos da UE se recusaram a reconhecer que a situação de segurança no Afeganistão era desoladora, que a intervenção havia falhado. Agora, quando é tarde demais, eles se mostram chocados – os políticos, a mídia e os acadêmicos. No entanto, países como a Alemanha têm uma responsabilidade. Em vez de apoiar senhores da guerra e políticos corruptos durante anos, eles deveriam ter se dedicado seriamente ao povo afegão e à sua cultura. Deveriam ter escutado as mulheres em vez de apaziguá-las. Em vez de construir um exército, deveriam ter trabalhado com o povo para criar uma perspectiva para o país. E agora? Os Estados ocidentais da comunidade internacional devem acolher os refugiados afegãos o mais rápido e sem burocracia possível. E eles deveriam finalmente reconhecer aqueles que esperam por uma decisão nos países da UE, às vezes sob condições deploráveis. O mesmo vale para os que virão nos próximos meses e anos do país destruído que o Ocidente deixou para trás. Isso é o mínimo que a Europa pode fazer pelo povo do Afeganistão.
(Publicado em 16/VIII/2021)